Maria Adelina Penha da Rocha Barros

 

Maria Adelina Penha da Rocha Barros

A D. Lininha, como carinhosamente era chamada

 



António Abílio Barros de Sá Lima



Nascida da família Clara Penha, desde sempre ligada à restauração, a D. Adelina, acabada de sair da adolescência, apaixonou-se pelo António Emílio, também de família ligada à restauração, com quem, aos 17 anos, se casou.

Unidos os “trapinhos”, “botaram” mãos ao trabalho, porque era preciso fazer algo pela vida e pelos filhos que começaram, desde logo a aparecer.

A aposta foi para o desenvolvimento da então “Casa Encanada”, de que a família do marido era proprietária e cujo nome terá a ver com uma alcunha posta a um membro do clã.

D. Adelina, com um sentido muito especial para a gastronomia tradicional, tratava do bom funcionamento da cozinha, enquanto António Emílio se dedicava à compra, pelas aldeias do concelho, do vinho e dos animais, para o estabelecimento e para os talhos de que eram proprietários – um de carne de vaca e outro de carne de porco e miudezas.

Até, sensivelmente, ao início dos anos 50, a “Casa Encanada” de que o casal era, já nessa altura, proprietário absoluto, dedicava-se quase que exclusivamente à venda de bebidas, petiscos, tabaco, carne de porco salgada e algumas pequenas refeições.

Por força da cada vez maior afluência de clientes em busca de boa comida, tudo isso acabou, sendo a velhinha “Casa Encanada”, com as suas portas de batente (a isso foram obrigados, parece que por portaria da Câmara Municipal), em algo mais consentâneo. Surgiu, deste modo, o “Restaurante Encanada” e, com ele, uma maior projecção do saboroso sarrabulho, cada vez mais conhecido além fronteiras concelhias, sendo, também, mais apreciado e procurado, muito embora já se confeccionasse – e bem – tanto na antiga “Casa Encanada” como em outros estabelecimentos, alguns deles ligados à família, e ainda em algumas casas particulares das nossas aldeias, por alturas da matança do porco.

Das mãos sábias da D. Lininha, como era carinhosamente chamada e que chefiava um excelente conjunto de cozinheiras limianas (lembro a D. Carlotinha e a Teresa Bitotas (ambas já falecidas); a Pireza; a Fernanda Rola; a Rosa Pereira; a Fernanda (no actual Restaurante Encanada); a Glória (no Restaurante Gaio); a Angelina (hoje na chefia das cozinhas da Escola Secundária); a Benvinda e a Guida Ferreira); a Júlia (funcionária da Câmara Municipal) e tantas outras… daquelas mãos saiam “aquele” arroz divinal! “aqueles” rojões! “aquelas” batatas douradas! “aquelas” farinheiras! “aquelas” chouriças de verde! “aquelas” chouriças de carne! “aquelas” belouras! – pequenas maravilhas que a todos deixavam com água na boca só de as olhar! E a D. Adelina fazia questão de não servir sarrabulho a ninguém, se não houvesse todos esses ingredientes!

E as sobremesas? O leite creme queimado! O pudim de laranja! De comer e de chorar por mais! Autênticas iguarias!

E lá estava a simpatia, o profissionalismo de António Emílio, companheiro de sempre, a fazer o resto! (dizia-me, ainda há pouco tempo, um amigo, o João de Freitas, alto Quadro da Direcção Geral do Turismo, que não conheceu nenhum relações públicas como ele!).

A afluência ao restaurante, em busca, principalmente do saboroso Sarrabulho, começou a ser cada vez maior e o espaço físico, cada vez mais exíguo! Era necessário avançar para algumas obras, poucas, que a Câmara Municipal não deixava mexer muito!

O espaço para mesas foi ampliado, foram criadas melhores condições de atendimento, de modo a receber os visitantes com a máxima simpatia e conforto, porque alturas havia em que, principalmente aos sábados e domingos, nos meses de Janeiro/Fevereiro/Março, até no interior do mercado se colocavam mesas para atender tanta gente que vinha em busca do sarrabulho, do sável (havia-o – que saudade!, em quantidade, no Rio Lima) e, também, da lampreia!

A fama do tradicional Sarrabulho, que se tornou um veículo cultural da gastronomia limiana, tinha chegado aos confins deste país à beira mar plantado!

“Vinha gente de Lisboa, de propósito, ao sarrabulho! (e, nessa altura, era quase… um dia de viagem!).

Já nessa altura, outros restaurantes, além do Encanada, se destacavam – o Gaio, a Petiscas, a Clara Penha, o Catrina, a Rosa Paula e outros.

Com o sarrabulho a ser figura obrigatória do cardápio limiano e, muito por força da sua implantação, foram aparecendo muitos outros restaurantes no concelho, nem todos, infelizmente, honrando o esforço que os pioneiros do seu “descobrimento” fizeram para o fixar em Ponte de Lima, como um dos mais completos pratos gastronómicos do País!

Em 1973, com os filhos, seis, uns por terras de Angola, outros por cá, mas todos com a vida estabilizada fora da vida da restauração e não interessados na continuidade à frente do Encanada, a D. Adelina e o António Emílio resolveram passar o testemunho aos actuais proprietários.

Foram anos difíceis, pela saudade, os que se seguiram! Mas, o tempo tudo apaga e o Restaurante Encanada continua, a par de outros, com a pujança que todos conhecem.

Como que agradecendo a Deus tê-la ajudado e aos seus, na sua caminhada pela vida, D. Adelina retribuía, naqueles anos de pós-guerra, ajudando muita gente, em tempo de muita fome!

A ambos, Adelina e António Emílio, se deve atribuir a criação de uma grande Escola, de onde saiu uma plêiade enorme de profissionais que, há mais de meio século, vêm divulgando e promovendo a identidade e autenticidade da gastronomia limiana, nomeadamente, do SARRABULHO, da LAMPREIA e do SÁVEL do nosso Rio Lima! (1)

(1) Texto da intervenção de António Abílio Barros de Sá Lima na cerimónia de entrega da Medalha de Mérito Cultural com que sua mãe foi distinguida pela Câmara Municipal de Ponte de Lima, em 4 de Março de 2004, Dia de Ponte de Lima.

Em 27 de Outubro de 2014, Maria Adelina Penha da Rocha Barros viria a ser distinguida também com uma homenagem promovida pelo Rotary Clube de Ponte de Lima.

Nascida a 13 de Março de 1925, Maria Adelina Penha da Rocha Barros faleceu em 29 de Junho de 2015, com 90 anos de idade, tendo a Câmara Municipal de Ponte de Lima aprovado, por unanimidade, um voto de pesar pelo seu falecimento, na reunião de 6 de Julho de 2015.

Ponte de Lima no Mapa

Ponte de Lima é uma vila histórica do Norte de Portugal, mais antiga que a própria nacionalidade portuguesa. Foi fundada por Carta de Foral de 4 de Março de 1125, outorgada pela Rainha D. Teresa, que fez Vila o então Lugar de Ponte, localizado na margem esquerda do Rio Lima, junto à ponte construída pelos Romanos no século I, no tempo do Imperador Augusto. Segundo o Historiador António Matos Reis, o nascimento de Ponte de Lima está intimamente ligado ao nascimento de Portugal, inserindo-se nos planos de autonomia do Condado Portucalense prosseguidos por D. Teresa, através da criação de novos municípios. Herdeira e continuadora de um rico passado histórico, Ponte de Lima orgulha-se de possuir um valioso património histórico-cultural, que este portal se propõe promover e divulgar.

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